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Um Cartel Organizado pelo Estado no Transporte Rodoviário?

A Medida provisória n° 832 de 27 de maio de 2018, que instituiu a política de Preços Mínimos do Transporte Rodoviário de Cargas, é uma legislação que contraria a preocupação do Estado brasileiro, desde a aprovação da Lei 8.884/94, que tratava da Defesa da Concorrência, de não promover coordenação de preço a partir de ações de governo. Regulação de preço dá-se em situações excepcionais e, na quase totalidade dos casos, em defesa do consumidor – neste sentido, os preços indicados são sempre teto, e não piso.

A Lei 12.529/11, a nova Lei de Defesa da Concorrência, estabelece que a coordenação de políticas comerciais é ilícito concorrencial. É certo que o governo tem o poder, por meio de legislação específica, de criar uma situação excepcional, na qual não se aplicam os princípios concorrenciais. Este é o caso da medida provisória em discussão. Os artigos 5 e 6 desta medida são particularmente preocupantes. O art. 5 estabelece indexação semestral para os preços deste setor (uma ameaça à estabilidade de preços e um estímulo à reindexação da economia) e punição que visa impedir que os transportadores pratiquem preços abaixo da tabela, mesmo quando seja de seu interesse. Já o art. 6 estabelece um direito das cooperativas de transporte de carga, dos sindicatos de empresas de transportes e de transportadores autônomos de carga de participarem do “processo de fixação de preços mínimos”. Ou seja, a MP 832/2018 traz todas as características de um cartel promovido pelo Estado. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), em diversas composições de seu tribunal, condenou duramente tabelas de preço. Entre essas decisões estão, por exemplo, a condenação de tabela de preço de serviços médicos; de tabela de preço de frete de transporte de combustíveis; e em outros mercados, como de autoescolas e agências de viagens.

Nós, do Grupo de Direito, Economia e Concorrência (Gdec), grupo de pesquisa formado por professores do IE-UFRJ especializados no tema, alguns dos quais ex-conselheiros e ex-economistas-chefe do Cade, entendemos que essa medida provisória é altamente prejudicial ao ambiente concorrencial, seguindo em linha oposta à Política de Defesa da Concorrência, que tem sido implementada no Brasil por governos de várias inclinações ideológicas nos últimos 25 anos. Em particular, a medida provisória abre espaço para que a regulação de preços do setor seja feita pelo custo do transportador menos competitivo, premiando a ineficiência, reduzindo o estímulo ao investimento e aumentando o preço aos consumidores. Pelas razões expostas, decidimos tornar públicas as razões de nossa posição contrária a esta particular solução oferecida apressada e irrefletidamente ao grave problema de determinação do preço de transporte no Brasil.

Camila C. Pires-Alves

Eduardo Pontual Ribeiro

João Luiz Pondé

Luiz Carlos Delorme Prado

Maria Tereza Leopardi

Mario Luiz Possas


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